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Regresso às Pedreiras do Poio

Publicado nas atas do III Congresso da Associação dos Arqueólogos Portugueses, saiu agora artigo coletivo sobre estes trabalhos de escavação dum sítio de fossas em pleno Alto Douro:

Trabalhos arqueológicos no sítio Calcolítico da Pedreira do Poio
Carla Magalhães / João Muralha / Mário Reis / António Batarda Fernandes

‘Museu’ Digital Hoje, (Novamente) Armazém Amanhã…

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ATELIER DES LUMIÈRES Paris’ first digital museum of fine art finds home in 19th-century foundry

Inaugurado em Abril de 2018, o Atelier des Lumières em Paris, França, é mais um espaço que como outros, também por , tenta capitalizar o ‘digital’; a suposta apetência do público, e das novas gerações, pelas experiências ‘imersivas’ bem como por experiências divertidas, levezinhas, mas também o mais que se verá. Apresenta ‘colagens’ digitais, projectadas nas paredes duma antiga fundição reconvertida para o efeito, principalmente de obras de Klimt e um outro artista da sua ‘escola’, Hundertwasser, para além de um espaço mas reduzido dedicado a artistas digitais emergentes. Um sofisticado sistema sonoro completa a experiência, debitando, entre outros, Wagner, Beethoven ou Mozart. Este investimento privado que, como referem os seus promotores, não deverá ser visto como um Museu, mas sim um complemento (a quê?) que pode fazer aproximar as gerações mais novas à Arte pois hoje em dia o público “já não aprende como anteriormente”. Desde a abertura, terá sido visitado por cerca de 400 000 visitantes. Como se pode ver no vídeo abaixo, ligado a partir da página do empreendimento, o factor “Uau!!!” está mesmo presente, é de facto uma experiência, digo eu, espectacular!

E que experiência de visita é esta? Se é verdade que os formatos ‘digitais’ são um média artístico como qualquer outro, e existam muitos exemplos de peças engajadas, subversivas ou iluminantes (mais uma vez, ver MAAT?), não me parece que à projeção dum ‘digest’ da obra de um qualquer artista, por mais bem conseguida a bricolage e mise-en-scène, se possa dar o nome de ‘Arte digital’, ou mesmo Arte…

E, mal pergunto, Klimt em Paris, França? Ainda que em Paris, Texas, fizesse ainda menos sentido(?), como já notado, onde há turistas, há público e 400 mil entradas atingem-se rapidamente, em ano de abertura. Aturada pesquisa de mercado, nomeadamente sobre o impacto que as obras de Klimt teriam, certamente ditaram a escolha do austríaco. (Das questões de © e royalties nem ouso querer saber, mas podem tentar…). No entanto, essa será a menor das preocupações dos promotores, a avaliar pela dinâmica entretanto demonstrada pela atração, sendo que as exposições blockbusters se sucedem como se pode avaliar pelas exposições digitais da obra de grandes artistas já carreadas, como por exemplo:

Por outro lado, a fé depositada nos bolsos das novas gerações talvez seja excessiva, já que em menos de uma década, muito provavelmente, os novos dispositivos 3D, de realidade aumentada, etc., se encarregarão de tornar anacrónicos espaços como este.

E os museus, saber-se-ão manter actuais, portanto físicos, com porta aberta? Para além de muitas outras considerações, parece avisado não tentar concorrer com as mesmas armas, e no mesmo campo de batalha, ou seja, não fazer uso do ‘digital’ indiscriminadamente, mesmo existindo fundos suficientes, com propósitos de apresentar experiências cada vez mais ‘imersivas’ e grandiosas, mas sim como um complemento de visita sóbrio, subtil, informativo e, claro, lúdico. É que, evocando a vox pop, os museus nunca deixarão de ‘apenas’ serem ‘”armazéns’ de inutilidades” se não assumirem o seu carácter único.

Devido à natureza potencialmente desafiadora e questionante da maioria, se não de todas, as suas coleções, os museus estão numa posição privilegiada para se posicionarem contra o processo em curso de promoção da ignorância liderado por diversas forças que se tentam esconder por detrás do ‘mercado’, ou se encontram mais ou menos abertamente presentes em movimentos nacionalistas. É uma questão de tentar engajar, questionar e confrontar o público de tal forma que questões complexas e mais exigentes se tornem mais fáceis de compreender e, mais importante, de plantar a semente da curiosidade, fomentar o pensamento independente e estimular a empatia pela diversidade. Embora a tal pudessem almejar, se também não fossem instrumentos de dominação escapistas perfeitamente integrados nas ‘dinâmicas de mercado’, não parece que espaços como este que fazem do uso do ‘digital’ o conteúdo (como McLuhan dizia, “o meio é a mensagem”), ou museus por caminhos semelhantes, consigam alguma vez deixar de ser os tais ‘armazéns’, por mais revestidos estejam de diáfanos robes ‘digitais’, pilhados aqui ou ali de forma mais ou menos aleatória.

The Entrapment of Art: Rock-Art, Order, Subversion, Creativity, Meaning, and the Appeal of Illusive Imagery

kkkkk

Canada do Inferno, Vale do Côa, Foto de Mário Reis.

Abstract

Bringing together apparently opposing modern and post-modern approaches to interpretation is one of the challenges that lie ahead for rock-art studies. This endeavour may help to surmount ‘no interpretation is possible’ stances (see Bednarik, 2014) and to value rock-art as a diverse and complex phenomenon where precise significance is concealed within multiple meaning-carrying conveyors. The idea that different rock-art traditions (as with any other art form) made use of a given set of symbols (also) aiming to enforce an ‘imagined’ order is instrumental to the present paper. Ancient imagery, despite precise production contexts, materializes the need to resort to visual symbols in order to help maintain social concord, regardless of exact meaning. However, this is a dynamic process; whenever there is an effort to uphold a certain set of moral and social complying principles, there are also nonconformist and subversive attempts to challenge and mutate that same collection of rules.

https://doi.org/10.1515/opar-2018-0017

Quem conta um conto acrescenta um ponto

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Dan Piraro é um prolífico cartunista norte-americano que, como todos os colegas de profissão (veja-se o nosso Luís Afonso), muito explora o referencial pré-histórico. Este cartune (parece que é assim o português correcto) é para mim interessante por vários motivos, desde logo porque evoca (e questiona, mas já lá vamos) a imagem popular estandardizada da humanidade pré-histórica: a moca, as peles à moda de tanga e toga, as fácies ‘neandertalizantes’, enfim, uns selvagens! Por experiência própria, sei que é um desafio para aqueles que trabalham sobre este período e o apresentam ao grande público tentar desmistificar tal imagem. Não seria tanto assim; a sofisticação conceptual e prática que se intuí e estuda nos vestígios da época (nas mais ‘singelas’ ferramentas líticas, nos adornos, na Arte Rupestre…) demonstrará precisamente o que o cartune questiona, não sei se de forma deliberada ou não. Ou seja, quem viveu há 20 000 anos atrás, possuía uma tecnologia adaptada ao estádio de desenvolvimento humano alcançado. Não andávamos de bicicleta apenas porque tal forma de locomoção não havia sido ainda inventada, como discute Tim Ingold. Por outro lado, a invocada sofisticação (há quem também lhe chame Cultura) potenciou desde cedo uma ambiguidade latente e auto-reflexiva na abordagem desse ‘monstro-de-muitas-patas-e-olhos’ chamado o real.

Eu explico: a pesquisa arqueológica identificou maioritariamente em níveis de ocupação do Paleolítico Superior na Europa Ocidental, ossos de animais de pequenas dimensões, supondo-se que estes constituíam o grosso das fontes animais de alimentação das comunidades daquela época. Ora, como é sabido, na arte rupestre gravada e/ou pintada em grutas e em painéis ao ar livre desta região e contemporânea destes níveis de ocupação, figuram maioritariamente herbívoros de grandes dimensões. Deste facto não se poderá inferir que a interpretação clássica acerca do carácter propiciatório da prática artística estará necessariamente equivocada. Contudo, indo além do proverbial “Quem conta um conto acrescenta um ponto”, este cartune capta de forma bem apanhada a necessidade humana de contar histórias extraordinárias que questionem deliberada e ambivalentemente a realidade moldando-a às necessidades precisas do tal estádio de desenvolvimento em que nos encontrávamos. Querendo, quem não tem auroque caça com esquilo…

 

Visiting Fellow

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Muito contente e orgulhoso por ter sido nomeado Visiting Fellow to the Faculty and Science & Technology, Centre for Archaeology and Anthropology, Bournemouth University!

Very proud and happy for having been appointed Visiting Fellow to the Faculty and Science & Technology, Centre for Archaeology and Anthropology, Bournemouth University!

“This appointment is intended to recognise those regarded by their peers as having a suitable record of recently published research output or considerable standing in their profession/vocation area, and who are able to support the research and teaching activities of the University in a specific subject area.”

A Presença em Linha do Museu e Parque Arqueológico do Vale do Côa como um Caso de Estudo em Arqueologia Pública

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Pretende-se com este artigo fazer uma análise acerca do alcance da presença em linha do Museu e Parque Arqueológico do Vale do Côa. Para além duma análise crítica de dados estatísticos, sempre relevantes para medir o sucesso de estratégias implementadas, será também abordado o papel que a presença em linha duma instituição com as características do Museu e Parque do Côa poderá desempenhar naquilo que se pode designar como a ”responsabilidade social da Arqueologia”. Referência será feita à presença nas designadas redes sociais (Facebook, Twitter e TripAdvisor) mas este artigo focar-se-á essencialmente no alcance da página oficial e do canal no Youtube, numa perspectiva que valorizará esta presença como um “serviço público” prestado pela entidade gestora do Museu e Parque do Côa, a Fundação Côa Parque.

Fotos de mil anos

Uma foto com 1000 anos (e até bastante mais) será o sonho de qualquer geólogo! Apesar de ser arqueólogo e não geológo, no decurso das visitas que se fazem ao território do Parque Arqueológico do Vale do Côa, costumo referir, junto de públicos que denotam interesse por essas matérias, e para facilitar a compreensão das dinâmicas geomorfológicas construtoras dos relevos que nos rodeiam, que se tivéssemos a oportunidade de colocar uma máquina de filmar numa posição elevada, dotada de filme que gravasse durante milhares de anos, iríamos conseguir ver o planeta a mexer no filme resultante, aplicando obviamente uma velocidade bem rápida à metragem obtida. Pois bem, um “filósofo experimental” tem vindo a instalar em Tempe, Arizona, não uma câmara de filmar (ooohh) mas máquinas fotográficas que conseguirão capturar fotos de mil anos.

“The camera uses a pinhole to slowly capture an image.” http://www.fastcoexist.com/3044515/these-1000-year-long-photos-wont-be-ready-until-3015#4

Como as películas disponíveis não aguentam tanto tempo, o autor da experiência foi aos arquivos históricos e arqueológicos para encontrar um material que potencialmente dure os tais mil anos. A escolha acabou por recair numa chapa de cobre coberta de camadas de tinta que irão lentamente desaparecer com a exposição à luz que entra pelo pequeno buraco da câmara. Mil anos é pouco tempo para capturar algo de monta na evolução geomorfológica embora, muito ironicamente, nenhum de nós cá esteja para ver a foto obtida, o que é pena porque teria muita curiosidade em ver o resultado final, que se espera que seja um êxito… Seria fantástico poder fazer a experiência também aqui pela região do Alto Douro onde trabalho e capturar as transformações milenares das suas fantásticas paisagens!…

Foto: António Batarda

Foto: António Batarda

Galeria (2) online de figuras do livro “Open-Air Rock-Art Conservation and Management State of the Art and Future Perspectives”

Como já aqui mencionei, o livro “Open-Air Rock-Art Conservation and Management – State of the Art and Future Perspectives”, a que aqui e aqui já fiz referência, implicou a criação de galerias web onde imagens a cores de dois capítulos pudessem ficar alojadas sendo que no corpo do texto foi inserida menção ao endereço dessas mesmas galerias para que os leitores possam visioná-las em complemento à consulta do livro.

A segunda galeria online que complementa o livro faz parte do sítio de um dos autores do capítulo “Irish Open-Air Rock-Art: Issues of Erosion and Management” e pode ser visualizada aqui. O autor em causa é Ken Williams, o grande fotógrafo da arte rupestre irlandesa. Como se pode verificar na visualização da página e de todo o sítio, estas são fotos de grande qualidade e que grandemente enriqueceram o livro. Aqui deixamos uma amostra não só como convite a uma visita ao sítio Shadows and stone como também à leitura do livro “Open-Air Rock-Art Conservation and Management – State of the Art and Future Perspectives”.

The most highly decorated panel of rock-art in the Derrynablaha group of carvings, Co. Kerry: a recent photograph demonstrates that the condition of the carvings remains relatively unchanged since the panel was recorded and photographed in the 1960s. (Photograph by Ken Williams. Copyright reserved.)

The most highly decorated panel of rock-art in the Derrynablaha group of carvings, Co. Kerry: a recent photograph demonstrates that the condition of the carvings remains relatively unchanged since the panel was recorded and photographed in the 1960s. (Photograph by Ken Williams. Copyright reserved.)

Open-air passage tomb rock-art: a moss-covered boulder at Forenaghts, Co. Kildare, now resting against the gable end of ruined medieval church. (Photograph by Ken Williams. Copyright reserved.)

Open-air passage tomb rock-art: a moss-covered boulder at Forenaghts, Co. Kildare, now resting against the gable end of ruined medieval church. (Photograph by Ken Williams. Copyright reserved.)

Do nome de um blogue/site

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From the movie The Lost World (1925) by Harry O. Hoyt.

Depois de muito puxar pela cabeça, pareceu-me que este nome se adaptava bem a um desafio que lancei a mim próprio: escrever um texto (longo ou pequeno) por dia (ou, num objectivo mais modesto, de dois ou três em três dias) sobre os assuntos que me suscitem interesse mas dentro do vasto campo da arte rupestre, museus, arqueologia e redes sociais.

Primeiro tentei aqui lembrando-me dum artigo que refere uma experiência semelhante àquela a que faço ligação: na barra de endereço do Google escrever frases abertas do género “porque é que a cultura é tão…” e ver o que aparece. Assim, este site/blogue esteve para se chamar “Why is culture so…?” (opção em aberto) ou “Why are museus so boring” (esta mais fechada). Aliás, esta última seria uma opção interessante pois é provocatória e serviria a um propósito de reflexão (também auto-irónica) sobre porque é que os Museus (não) são tão aborrecidos…

Mas depois lembrei-me dum artigo de Laurent Olivier lido há pouco tempo que refere, numa defesa militante da não mercantilização da cultura com relevo para o papel da História e Arqueologia, que a classe arqueológica deve tentar “re-encantar o passado (…) restituindo-lhe a sua carga de estranheza e indecifrabilidade”. Ora então aí está traçado o caminho: tentar perceber o que é ou não, deve ser ou não decifrável não só no passado “arqueológico” mas sobretudo nas relações que hoje em dia se estabelecem entre as diversas forças e actores que habitam “a construção do passado”, a sua divulgação e a sua mercantilização sob uma perspectiva que é a… minha!